Há mais de um mês, Ponta Grossa está refém do descaso. A população vê suas torneiras secas enquanto a Sanepar, empresa responsável pelo abastecimento, acumula lucros bilionários e distribui milhões em dividendos para seus acionistas. Água, um direito básico, virou um privilégio na cidade. A pergunta que não quer calar: até quando a incompetência e o desrespeito com os moradores serão tolerados?
A crise começou em 13 de fevereiro, quando a Sanepar iniciou cortes no abastecimento, deixando bairros inteiros sem água por dias. A desculpa? Um aumento do consumo devido à onda de calor. Mas a justificativa não se sustenta: afinal, onde está o planejamento? Como uma empresa bilionária não consegue prever um período de maior demanda e garantir o abastecimento? A realidade é que a população paga caro por um serviço que falha justamente quando mais precisa.
No último domingo (16), a situação atingiu um nível inaceitável: 70% da cidade ficou sem água. Escolas suspenderam aulas, hospitais adiaram cirurgias e até órgãos públicos interromperam atividades. Ponta Grossa entrou em colapso hídrico, e a resposta da Sanepar foi a de sempre: promessas vazias e nenhuma solução concreta.
A Sanepar é uma empresa de economia mista, com o Governo do Paraná como acionista majoritário. No papel, deveria equilibrar a prestação de um serviço essencial com a necessidade de manter-se financeiramente sustentável. Na prática, virou uma máquina de lucro, distribuindo dinheiro para investidores enquanto a infraestrutura segue precária.
Os números não mentem. Em 2023, a Sanepar faturou R$ 1,5 bilhão, um crescimento de 30,6% em relação ao ano anterior. O lucro líquido atingiu patamares históricos, enquanto a população sofre com torneiras secas. Para os acionistas, R$ 452 milhões em dividendos. Para os moradores, falta d’água e desculpas esfarrapadas.
E aqui está a verdadeira questão: uma empresa que deveria fornecer um serviço essencial deve priorizar o lucro ou a qualidade do atendimento à população? Porque está claro que a Sanepar fez sua escolha. Enquanto os investidores celebram os rendimentos, os moradores de Ponta Grossa racionam baldes de água e recorrem a bicas na rua para suprir necessidades básicas.
Se a Sanepar tem tanto dinheiro sobrando para dividir entre acionistas, por que não há investimentos robustos em infraestrutura? Por que as redes de distribuição não estão preparadas para suportar oscilações de demanda? E o mais revoltante: onde está o governador do Paraná em meio a essa crise? O governador do Paraná está esperando o quê? Que a população continue tomando banho de caneca enquanto os acionistas da Sanepar fazem brindes com champanhe comemorando seus dividendos?
Essa crise não é um incidente isolado. Municípios em todo o Paraná já enfrentaram situações semelhantes. O que aponta para um problema muito maior: a Sanepar não é uma empresa mal gerida ocasionalmente. Ela é sistematicamente ineficiente quando se trata de priorizar os cidadãos em vez do mercado financeiro.
Se a empresa não tem condições de garantir água para uma cidade de 370 mil habitantes em pleno 2025, qual será o próximo município a entrar em colapso? E mais importante: até quando o governo estadual continuará a fingir que esse modelo de gestão funciona?
A primeira exigência é um plano de ação imediato e transparente. A Sanepar deve informar, com clareza, quando o abastecimento será normalizado e quais medidas estruturais serão adotadas para evitar que isso aconteça novamente.
Além disso, a Assembleia Legislativa do Paraná e os órgãos de fiscalização precisam intervir com CPIs, multas e todo o ferramental disponível. Se a Sanepar fosse uma empresa privada comum, a justificativa do lucro faria sentido. Mas é uma empresa com participação estatal! Se o governo tem controle, então é conivente. O que a Assembleia Legislativa está esperando para abrir uma CPI? Como uma empresa que lucra bilhões vem a falhar tão miseravelmente em sua função mais básica? Quais contratos precisam ser revistos? Quem será responsabilizado?
A crise hídrica em Ponta Grossa não é apenas um problema de infraestrutura. É um retrato do descaso com a população, da priorização do lucro sobre o bem-estar das pessoas. E enquanto isso não mudar, a história continuará se repetindo: torneiras secas, promessas vazias e milhões de reais fluindo para os bolsos de quem não tem que lidar com a falta d’água.