Quando uma obra entrega mais que atendimento, entrega visão

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Quando uma obra entrega mais que atendimento, entrega visão
Quando uma obra entrega mais que atendimento, entrega visão

Em tempos em que se cobra tanto das prefeituras, poucas conseguem entregar estrutura e visão ao mesmo tempo. Ponta Grossa, agora, entregou ambas.

A inauguração da nova UPA Uvaranas é, sem dúvida, um marco importante para a cidade. Estrategicamente localizada na região de maior população da cidade, a unidade amplia a capacidade de atendimento de urgência e emergência, desafoga as outras UPAs e reforça o compromisso da Prefeitura com a saúde pública, especialmente em um momento de alta demanda por atendimentos pediátricos e respiratórios.

É justo reconhecer, trata-se de uma entrega robusta, bem equipada, moderna e necessária. E mais do que uma obra física, a nova UPA simboliza um gesto político, o de olhar para as regiões mais populosas da cidade e ampliar o acesso à saúde. Nesse aspecto, a prefeita Elizabeth Schmidt merece o mérito pela condução do projeto, pela escolha do modelo construtivo ágil e por responder a uma demanda que já não podia mais esperar.

O caso de Ponta Grossa é emblemático. Como cidade-polo dos Campos Gerais, ela sustenta uma estrutura de saúde que vai muito além das fronteiras do município. São mais de 350 mil moradores locais, mas os atendimentos se estendem diariamente a pacientes de dezenas de cidades vizinhas. As duas UPAs existentes, Santa Paula e Sant’Ana, além do Hospital Universitário Regional e do HUMAI, operam em regime de pressão constante, acolhendo uma demanda que cresce a cada ano.

Nesse cenário, a decisão da Prefeitura de fechar o antigo Hospital Municipal Amadeu Puppi, embora polêmica à época, revela-se tecnicamente coerente. O prédio apresentava sérios problemas estruturais, e o município acabava arcando com um serviço hospitalar que, na prática, funcionava como suporte regional, uma função que deveria ser assumida pelo Estado, como já acontece com o Hospital Regional. A medida foi, portanto, um realinhamento de responsabilidades, abrindo caminho para uma política de saúde mais racional, em que o município foca na atenção primária e na urgência, enquanto a média e alta complexidade são regionalizadas de forma responsável.

É justamente nesse ponto que se impõe uma reflexão mais ampla: até que ponto faz sentido delegar aos municípios a responsabilidade por manter estruturas tão complexas e custosas, se o atendimento extrapola suas divisas e atende a macrorregiões inteiras? O financiamento da saúde, como prevê o SUS, deve ser tripartite, com União, Estado e Município compartilhando esforços. Mas, na prática, os municípios acabam assumindo responsabilidades que não lhes cabem, por falta de estrutura estadual ou repasses federais compatíveis.

A própria transformação do antigo Hospital da Criança em Hospital Universitário Materno-Infantil, HUMAI-UEPG, é um exemplo do caminho que deveríamos trilhar. Ao estadualizar a gestão, com suporte técnico e orçamentário da Universidade Estadual de Ponta Grossa, o hospital ganhou nova vida, ampliou serviços, modernizou equipamentos e se consolidou como referência em obstetrícia e pediatria para toda a região.

A entrega da UPA Uvaranas, portanto, não apenas fortalece a rede de urgência e emergência, mas também sinaliza uma visão estratégica da gestão municipal. Essa abordagem abre espaço para revisitar projetos anteriormente descartados, como a construção de uma UPA no Jardim Carvalho. Em gestões passadas, essa iniciativa foi cancelada, resultando na devolução de recursos federais e na frustração da comunidade local. Com a experiência adquirida e a infraestrutura já existente, retomar esse projeto poderia ampliar significativamente o acesso à saúde em outras regiões da cidade.

O que a nova UPA Uvaranas nos ensina, portanto, é duplo: de um lado, a importância de gestores que entregam obras concretas e necessárias, de outro, a urgência de um debate nacional sobre a redistribuição justa das responsabilidades sanitárias. Porque, no fim das contas, saúde não tem fronteira municipal, mas tem custo. E essa conta, se não for dividida de forma inteligente, seguirá penalizando justamente quem mais faz.

A cidade mostrou que sabe fazer. Cabe agora aos governos estadual e federal reconhecerem esse esforço e virem juntos, não apenas com recursos, mas com a responsabilidade que também é deles. Porque quando o município entrega visão, o mínimo que se espera dos demais entes é que enxerguem com seriedade.

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