Sabe aquele conteúdo que, quando você entende e aplica, provoca em você um novo jeito de ver o mundo? Compreender o que é o pensamento de segundo nível foi justamente isso para mim.
Em resumo, trata-se de um processo reflexivo que vai além da superfície, analisando as consequências de longo prazo de algo, e não apenas o resultado imediato.
No livro O mais importante para o investidor: Lições de um gênio do mercado financeiro, Howard Marks apresenta esse e outros conceitos que deveriam acompanhar o investidor ao longo da sua tomada de decisão.
Nesta matéria, convido você a buscar comigo esse raciocínio e, a partir dele, entender o conflito comercial e jurídico entre Brasil e Estados Unidos.
Comércio internacional no governo Trump
No final do primeiro governo Trump houve uma escalada tarifária com a China, nada que possamos comparar a 2025, as tarifas chegaram a 25% em boa parte dos itens.
Em dezembro de 2019, o “Acordo Fase Um” foi assinado e boa parte do impasse foi resolvido. A chegada do governo Biden, em 2021, não veio acompanhado de uma postura agressiva no comércio internacional, pondo o assunto em segundo plano.
O final do ano eleitoral de 2024 foi positivo para os EUA, mercado de ações operando nas máximas, inflação sob controle e cortes de juros acontecendo, poucos esperavam o que foi o início do segundo mandato de Trump.
Abril de 2025 marcou esse novo governo como o começo das tarifas recíprocas, o objetivo era de corrigir desequilíbrios e proteger a indústria norte-americana. Mas será que precisam de proteção? Talvez sim, mas hiperproteção?
Vamos aprofundar a análise para responder a essas perguntas.
Apesar dos EUA serem a maior economia do mundo, desde 1982 (segundo o TradingView) eles não possuem uma balança comercial positiva, mas mesmo assim têm uma economia crescente. O país produz muito, tem consumo interno aquecido e importa mais do que exporta.

O pacote tarifário de 2025 desincentiva importações e realoca para o mercado interno a parcela da demanda antes atendida por importados. Isso melhorou a balança comercial no curto prazo. Em contrapartida, reduz a concorrência e eleva custos de insumos, o que tende a pressionar preços, via demanda e via custo. A magnitude depende de capacidade ociosa, câmbio, insumos importados e eventuais retaliações.
Tanto é que, desde a primeira reunião de 2025 do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) não houve mais cortes de juros, o Fed alertou que será cauteloso ao realizar novos cortes. A política conservadora de Jerome Powell, presidente do Fed, em relação aos juros se deve ao fantasma da inflação que pode voltar a assombrar em um cenário econômico aquecido.
E não é apenas no comércio internacional que vemos tensões, no campo jurídico e político, a relação entre Brasil e EUA também ganhou novos capítulos.
Chegou aos tribunais
Segundo o Tribunal de Apelações dos EUA, as tarifas recíprocas são ilegais. Porém, ainda é cedo para se chegar a qualquer conclusão, pois cabe recurso na Suprema Corte até o dia 14 de outubro de 2025.
As tarifas envolvendo o Brasil deram um passo além. No dia 09 de julho de 2025, Donald Trump enviou uma carta endereçada a Lula anunciando 40% sobre uma ampla cesta de bens brasileiros. A medida foi anunciada em meio às tensões políticas internas, julgamento de Jair Bolsonaro e decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). Somada à alíquota recíproca de 10%, a carga total chegou a 50%. Em primeiro momento era sobre todas as exportações brasileiras e depois foram excluídos alguns itens.
Sanções e Lei Magnitsky: por que isso importa
A Lei Magnitsky autoriza os EUA a sancionar estrangeiros, que ficam proibidos de transacionar com empresas norte-americanas ou com entidades que mantenham relações diretas com elas.
Se um agente for sancionado, no princípio afeta apenas a ele, a partir do momento que os bancos que conscientemente facilitarem operações podem sofrer sanções secundárias, como restrições a contas em dólar. Não há exclusão automática do SWIFT, mas o acesso pode ser severamente comprometido.
O investidor que compra ações do Banco do Brasil (BBAS3) corre o risco das sanções refletirem em seus investimentos. Se um banco tiver o acesso ao sistema global de transações restringido, o funding dólar encarece e as relações com arranjos internacionais ficam comprometidas, o lucro tende a cair.
Olhando para frente
Tratando-se propriamente de julgamentos, estamos num limbo informacional. Cada parte apresenta sua versão e seus fatos, e cabe às instâncias competentes decidir; a nós, ouvir.
Precisamos ter em mente que o próximo ano é eleitoral. Uma condenação de Bolsonaro abre espaço a novos candidatos de direita na corrida presidencial, esses disputarão o mesmo eleitorado.
Para além de investidores, somos cidadãos brasileiros, e todo movimento de sanção, julgamento ou decisão política envolvendo o Brasil impacta nossas vidas de alguma forma. Entender a maneira como esses fatores se refletem e como tomaremos nossas decisões depende de nós. O pensamento de segundo nível é uma ferramenta poderosa para isso. Ele não elimina a incerteza, mas nos dá clareza para decidir melhor. Que seja tão útil para você quanto tem sido para mim.