Os números da última pesquisa Genial/Quaest sobre o governo Lula dizem mais do que parece à primeira vista. É claro que ainda há apoio expressivo ao presidente, especialmente entre os mais pobres e no Norte e Nordeste. Mas em meio a esse cenário aparentemente estável, um movimento silencioso, e talvez mais significativo, começa a se formar. A imagem de Lula como um homem bem-intencionado começa a perder força. E, junto dela, se esvai a gratidão automática que muitos brasileiros associavam à figura do ex-metalúrgico.

DESAPROVAÇÃO
Segundo o levantamento, 56% dos brasileiros avaliam o governo como negativo, enquanto apenas 41% aprovam. É uma virada simbólica: já não se trata apenas de discordância pontual ou frustração passageira. A desaprovação cresce em intensidade, e em paralelo, diminui o número dos que acreditam que Lula governa com boas intenções. Não é mais uma questão de “errar tentando acertar”. Muitos agora enxergam ausência de rumo, de clareza e de prioridade com a vida real do cidadão.
Pior ainda para o governo: cresce o número de eleitores que votaram em Lula unicamente para barrar Bolsonaro, mas que hoje já não enxergam grandes diferenças entre os dois, ao menos naquilo que mais importa no dia a dia. Para quem está com o orçamento apertado, vivendo a base de promoções no mercado e fazendo malabarismo com as contas do mês, a sensação é de que nada mudou de verdade. Um prometia crescimento com austeridade, o outro com inclusão social. Mas, na prática, ambos entregaram uma economia instável, com preços altos, pouco emprego de qualidade e um sentimento constante de que a vida não anda. O discurso é diferente, mas o bolso segue vazio no que diz respeito à percepção do cidadão.
BENEFÍCIOS

Mais revelador ainda é o dado de que 70% dos brasileiros dizem não ter medo de perder benefícios caso Lula deixe a presidência. Esse número desmonta, de uma vez por todas, a ideia de que a população vê os programas sociais como conquistas pessoais do presidente. O medo acabou. O mito da dependência direta, também.
É curioso, ainda, que 67% dos brasileiros afirmem que algum programa do governo impacta positivamente a sua vida, e ainda assim, a maioria esteja insatisfeita com a gestão. Isso revela um amadurecimento político: o brasileiro entendeu que benefício não é favor.
A pesquisa ainda mostra que 51% dos brasileiros concordam que programas sociais são direitos e ninguém pode tirar, contra 42% que acham que esses programas não são garantidos e podem ser retirados. A maioria já compreende que políticas como o Bolsa Família são de Estado, e não uma esmola concedida por vontade presidencial. É um salto de consciência coletiva: os programas pertencem ao povo, e não ao governante da vez.
Essa percepção reduz o medo, tão explorado nas eleições, de que um governo de direita vá acabar com os benefícios. E com isso, a gratidão automática também se dissolve. O eleitor agora quer mais do que boas intenções e lembranças do passado. Ele quer entrega concreta no presente. Quer ver resultado no preço do feijão, na conta de luz, no posto de gasolina. Quer segurança, emprego e dignidade. Não quer discurso. Não quer lembrar de 2003 enquanto enfrenta 2025.
DEMOCRACIA
Essa nova postura crítica do eleitor talvez represente o maior avanço democrático desde a redemocratização. Quando o voto deixa de ser movido por medo ou gratidão, e passa a ser guiado por avaliação concreta, quem ganha é o Brasil. Lula ainda tem força. Mas também tem contas a prestar. E, pela primeira vez em muito tempo, o povo está disposto a cobrá-las sem louvá-lo ou lhe conceder gratidão automática.
Jorge dos Santos Avila Administrador, Especialista em Gestão de Negócios, Estudou também Economia. Atualmente, dedica-se dentre outras coisas a análises políticas e eleitorais, participando de podcasts e escrevendo artigos de opinião.