Ponta Grossa avança, mas o medo ainda mora em muitas casas

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Coluna por Jorge Avila Ponta Grossa avança, mas o medo ainda mora em muitas casas
Coluna por Jorge Avila Ponta Grossa avança, mas o medo ainda mora em muitas casas

Tem notícia que parece se repetir. Mas não é eco. É rotina. Mais uma vez, Ponta Grossa amanheceu com a manchete de uma mulher agredida dentro de casa. Em plena luz do dia. No bairro Uvaranas. Dessa vez, foram chutes. No chão da própria sala. Dados pelo companheiro com quem ela dividia o teto, os planos e, provavelmente, muitas tentativas de recomeço.

Essa não é uma história isolada. A cidade tem figurado entre os municípios com maior número de casos de violência doméstica no Paraná. Dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública apontam que, em 2023, o Estado registrou mais de 231 mil ocorrências de violência contra a mulher, incluindo ameaças, lesões corporais e descumprimentos de medida protetiva. Ponta Grossa aparece entre as cidades com maior volume de registros.

O cenário é preocupante também quando o assunto é feminicídio. Segundo o Laboratório de Estudos de Feminicídios da Universidade Estadual de Londrina, o Paraná contabilizou 69 feminicídios apenas no primeiro semestre de 2024, ficando em segundo lugar no ranking nacional. Até o fim daquele ano, o número de mulheres assassinadas no estado chegou a 168. O comparativo entre 2023 e 2024 aponta um crescimento de 20% nos casos.

Ponta Grossa também carrega feridas abertas nessa estatística. No fim de 2024, o assassinato de Priscila Eliz Sinhori, no bairro Órfãs, escancarou as falhas de um sistema que deveria protegê-la. Apenas uma medida protetiva foi insuficiente. Antes disso, outros feminicídios já haviam ocorrido em bairros como Cara-Cara e Oficinas, com ampla cobertura na imprensa local.

E a violência não para por aí. Um levantamento divulgado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, com base no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, mostra que a cidade está entre as 50 com mais casos de estupro no Brasil, com uma taxa de 87,3 casos a cada 100 mil habitantes, bem acima da média nacional.

O problema, porém, não nasce do nada. Antes do chute, teve o grito. Antes do grito, o controle. Antes do controle, a ameaça disfarçada de ciúmes. Antes da ameaça, o silêncio. O silêncio de quem viu, soube e não fez nada.

Enquanto isso, Ponta Grossa segue se consolidando como uma das melhores cidades do interior para se viver. A economia vai bem. O setor industrial, um dos maiores do Paraná, cresceu quase 38% em valor adicionado, alcançando R$ 12,6 bilhões no último ano, gerando emprego e renda. No cenário estadual, Ponta Grossa é hoje o quarto maior PIB do Paraná, uma das líderes em geração de riqueza e um polo de desenvolvimento que atrai investimentos, talentos e famílias inteiras em busca de qualidade de vida.

Esses avanços são reais. E transformam, de fato, a vida de muita gente. Quem anda pela cidade percebe o quanto ela pulsa. As vagas de emprego aumentaram, as oportunidades de formação profissional se ampliaram, o setor de serviços cresce, e o comércio se renova. Famílias que antes pensavam em sair em busca de trabalho agora encontram aqui a chance de construir futuro. O que antes era visto como cidade de passagem, hoje é destino de quem quer empreender, trabalhar, estudar e criar raízes.

Mas junto com esse avanço, vem também a responsabilidade de não deixar ninguém para trás. Porque de nada adianta uma cidade com parques novos, avenidas largas e fábricas modernas se, dentro das casas, mulheres seguem apanhando. Se crianças continuam crescendo cercadas de medo. Se famílias vivem em silêncio, com receio de denunciar.

Se a cidade avança em economia, saúde, cultura e infraestrutura, precisa avançar também no combate à violência que se esconde atrás de portas fechadas. O direito de viver com segurança e dignidade dentro da própria casa não pode ser luxo. Tem que ser o mínimo. Porque uma cidade só é verdadeiramente boa para se viver quando é boa para todos. Inclusive para quem hoje só consegue sobreviver.

O Paraná tem um programa estadual importante chamado Mulher Segura, que já conseguiu reduzir em até 37% os casos de feminicídio nas 20 cidades onde foi implantado segundo a própria Secretaria da Segurança Pública. Ponta Grossa, pelo tamanho que tem, pela liderança regional que exerce e pelos índices de violência que carrega, precisa estar na linha de frente dessa política pública. Não apenas no papel. Na prática. Com mais patrulhas, mais estrutura, mais acolhimento e, principalmente, mais prevenção.

Porque quando a violência atravessa a porta de um lar, ela não atinge só a vítima. Ela fere filhos, vizinhos, amigos. Sobrecarrega a rede de saúde, mobiliza a estrutura policial, abala a confiança na justiça. Atinge, de alguma forma, a cidade inteira.

E o silêncio… o silêncio também mata.

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