Responsabilidade não se mede em curtidas

Dizem que Getúlio Vargas aprendeu ainda menino que não se deve descer do umbuzeiro antes da hora. Fugindo de uma bronca, subiu na árvore e esperou. Esperou até que a raiva do pai se transformasse em preocupação, e a bronca virou abraço. A lição ficou: o tempo pode ser um aliado poderoso. Quem sabe esperar, governa com menos impulso e mais estratégia. Décadas depois, Tancredo Neves ensinaria outra lição política: popularidade não é para ser acumulada em cofre, é para ser investida em reformas que fazem o país avançar. Ele não queria ser apenas popular, queria ser útil. E para isso, não hesitava em usar seu prestígio para sustentar decisões difíceis.


É curioso como esses ensinamentos atravessam o tempo e encontram eco em gestões que, em pleno 2025, seguem apostando no que é certo, e não apenas no que é conveniente. Em Ponta Grossa, a prefeita Elizabeth Schmidt, ao conduzir o Ajuste Fiscal aprovado pela Câmara Municipal, fez exatamente isso: usou seu capital político não para preservar a própria imagem, mas para garantir que a cidade caminhe com responsabilidade. E mais do que isso, mostrou que uma liderança feminina pode, sim, ocupar o lugar da firmeza sem ceder ao populismo ou à hesitação. Enquanto muitos ainda esperam que mulheres sejam agradáveis antes de serem competentes, Elizabeth tem sido competente, mesmo que isso incomode quem ainda acha que firmeza tem gênero.


Na última semana de julho, a Câmara aprovou, em votação definitiva e unificada, seis projetos do chamado Ajuste Fiscal, propostos pela Prefeitura. Entre eles, a revisão da Planta Genérica de Valores dos imóveis, defasada desde 1978, a readequação da alíquota do ITBI, mudanças no ISSQN, redução do desconto do IPTU para pagamento à vista, um programa de recuperação fiscal e outro de regularização de áreas no Distrito Industrial. A oposição reclamou do rito. Chamou de atropelo. Mas não é de hoje que confundir falta de protagonismo com falta de transparência tem sido uma prática recorrente.
A verdade é que Elizabeth fez o que precisa ser feito quando se governa com seriedade. Preferiu o desgaste do agora ao colapso do depois. Preferiu o incômodo da coragem ao conforto da omissão. Popularidade, ela tem. A última pesquisa divulgada mostrou aprovação de 73%. Mas, em vez de usá-la como propaganda, usou como escudo técnico para avançar. Getúlio diria que ela esperou o tempo certo. Tancredo, que ela não desperdiçou o momento. Ambos, provavelmente, reconheceriam nela a difícil arte de decidir sem ceder.


Getúlio governava com um ouvido na rua e outro nos bastidores. Sabia ler os sinais da sociedade e os ruídos do poder. Tancredo costurava alianças com dedos de pianista e nervos de aço. Nunca foi um orador inflamado, mas sua serenidade era seu trunfo. Elizabeth não tenta ser nenhum dos dois. Mas, como eles, entende que administrar exige mais do que empilhar obras e cortar fitas. Exige visão de longo prazo, coragem para contrariar interesses e habilidade para transformar ruído em resultado.


A projeção é que o município aumente sua arrecadação, podendo alcançar um orçamento histórico de 2 bilhões. Mas o número, por si só, não conta tudo. O que importa é o que se fará com ele. E aí, o histórico da prefeita fala alto. De sua primeira gestão até aqui, entregou a nova UPA Uvaranas, requalificou unidades de saúde, manteve cinco anos consecutivos de nota A em capacidade de pagamento segundo o Tesouro Nacional, e levou Ponta Grossa a ser reconhecida pelo Sebrae com prêmios de inovação em empreendedorismo. Não se trata de arrecadar por arrecadar. Trata-se de dar fôlego à uma das cidades que mais cresce nos Paraná. Uma cidade que não pode ser travada por um modelo fiscal herdado da década de setenta, nem por uma planta imobiliária que ignora o presente.


Há quem diga que ela poderia ter esperado mais. Talvez pudesse. Mas o Brasil também é o país onde os mesmos que pedem diálogo criticam a demora. Onde quem exige urgência reclama de atropelo. E onde quem clama por responsabilidade fiscal resmunga quando a conta chega. Getúlio sabia que qualquer gesto de governo vem com ônus. E Tancredo, que toda decisão justa provoca barulho. Mas ambos sabiam algo maior: quando se está certo, é possível enfrentar o barulho com serenidade.


Elizabeth não tem a retórica grandiosa de Vargas nem o verbo pacificador de Tancredo. Mas tem algo que os une: a clareza de que governar exige pulso, não aplauso. Ela não governa para agradar bolhas digitais nem para medir curtidas. Governa com a consciência de que sua assinatura hoje repercute na cidade que seus netos herdarão amanhã. E, talvez por isso, sua gestão incomode tanto os que preferem a política da vitrine à política da entrega.
A aprovação do Ajuste Fiscal não foi um ato isolado. Foi consequência de uma leitura estratégica sobre o crescimento da cidade, da pressão por serviços, da chegada de novas indústrias, da demanda habitacional e da necessidade de equilibrar a equação entre arrecadação e investimento. Não adianta prometer mais escolas, mais saúde, mais infraestrutura, se o caixa não acompanha. E Ponta Grossa, para continuar crescendo com dignidade, precisava desse ajuste.
Elizabeth subiu no umbuzeiro. Esperou o momento certo. Leu o cenário. Sabia que haveria resistência. Que viriam críticas, manchetes mal-intencionadas, vídeos recortados. Mas, como Getúlio, entendeu que a hora certa não espera a hora confortável. E como Tancredo, confiou que a razão, mesmo impopular, é o único caminho possível para a responsabilidade republicana.


No fim das contas, o que se espera de um estadista não é que ele acerte sempre, mas que tenha coragem de fazer o que precisa ser feito. Que não se esconda atrás do medo do desgaste. Que enfrente as urgências do presente com a serenidade de quem já leu o futuro. E que, como Elizabeth fez, saiba que uma cidade só se liberta do atraso quando alguém decide, mesmo em meio ao barulho, assumir o custo de avançar.
Porque mais vale um gesto impopular com propósito do que uma popularidade vazia que se esfarela ao primeiro teste de realidade.

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